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Educação é o principal caminho para uma cultura da paz, afirma membro da SGI Brasil

De que forma podemos disseminar a cultura da paz num contexto em que a sociedade é tão excludente? Como essa cultura pode dialogar, por exemplo, com os modelos econômicos atuais, que fomentam exclusão, discriminação e violência? Esta é uma das respostas que a exposição Da Cultura de Violência para a Cultura de Paz, em cartaz no Shopping Norte Sul Plaza, em Campo Grande, quer responder. Produzida pela Soka Gakkai Internacional, a SGI, a mostra quer levar às pessoas reflexões sobre um mundo possível no qual a paz tem um status perene na sociedade. 

Criada em 2007, a expo já percorreu mais de 250 cidades em todo mundo. Até o dia 2 de outubro, é a vez de Campo Grande deparar-se com as propostas da exposição-documentário. para comentar aspectos da mostra, o publicitário Rodrigo Vieira, 34 anos, há 20 associado do braço brasileiro da SGI, conversou com o Jornal Midiamax, por e-mail. Na entrevista, Vieira destacou valores da SGI e explicou de forma bem detalhada porque o mundo precisa, urgentemente, de paz. Confira.

?MIDIAMAX - De que forma podemos disseminar a cultura da paz num contexto em que a sociedade que é tão excludente? Como essa cultura pode dialogar, por exemplo, com os modelos econômicos atuais, que fomentam exclusão, discriminação e violência? RODRIGO VIEIRA - Ao adotar a Cultura de Paz, empoderamos todos os indivíduos para promover mudanças positivas na sociedade em que cada um vive baseados no respeito mútuo e na valorização da vida. O simples fato de desejar viver com conforto enquanto ignoramos o fato de que outras pessoas estão sofrendo com problemas de moradia, alimentos, saneamento básico, saúde, pobreza e desigualdade social figura a Cultura de Violência. Nosso desafio é abandonar essa Cultura de Violência que é silenciosa e encontra na apatia o fio condutor para se instalar na vida das pessoas e levar uma sociedade à degradação de princípios e valores. O renomado economista paquistanês Mahbub Ul Haq, um dos criadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) adotado pela ONU definiu a Segurança Humana da seguinte forma: "Em última análise, a segurança humana é uma criança que não morreu, uma doença que não se disseminou, um emprego não perdido, uma tensão étnica que não culminou em violência, um dissidente que não foi silenciado. A segurança humana não é uma preocupação com as armas – é preocupar-se com a vida humana e com a dignidade”. A Soka Gakkai Internacional (SGI) é uma ONG que vem contribuindo com as Nações Unidas que tem no preâmbulo de sua constituição a seguinte frase: “Já que as guerras começam na mente dos homens, é na mente dos homens que as defesas de paz devem ser construídas.” A exposição Da Cultura da Violência para a Cultura da Paz já percorreu mais de 250 cidades desde 2007, quando houve a primeira edição. Que percepção a Soka Gakkai Internacional tem deste trabalho? Que resultados positivos consegue-se destacar a partir dessa mostra?

O objetivo da exposição é chamar a atenção, conscientizar e fazer cada pessoa refletir para promover mudanças profundas. Acreditamos que devemos criar condições principalmente para os jovens utilizem toda sua energia na criação de valores que sustentem seus objetivos e ideais, que visem não somente suas realizações pessoais, mas uma sociedade que respeite e dignifique o ser humano. O senhor Daisaku Ikeda, atual presidente da SGI, é a prova real de que não há limites para as realizações humanas quando elas são motivadas por um grande ideal e juramento. Daisaku Ikeda Nasceu em Tóquio, Japão, em uma família de produtores de alga marinha. Criado em meio a Segunda Guerra Mundial, sua vida foi forjada por lembranças inesquecíveis do horror a guerra. 

Presenciou seus quatro irmãos mais velhos serem recrutados pelo exército, sendo que o primogênito foi morto em combate. Tais experiências somadas ao tormento da sociedade japonesa pós-guerra, fomentaram seus esforços de erradicar as causas fundamentais do conflito humano. Conheceu Josei Toda e imediatamente identificou nele seu mento. Dele herdou o ardente desejo pela Paz e o clamor pela direito à vida. Daisaku Ikeda redige anualmente propostas de paz que são enviadas à ONU com o desejo de contribuir com a construção de uma sociedade mais pacífica. É dele a seguinte frase: “Por mais complexas que as questões globais pareçam ser, devemos nos lembrar de que fomos nós quem as criamos, portanto, é impossível que estejam além de nossa capacidade humana de resolvê-las. Um novo enfoque da humanidade, a reforma e redescoberta de nossas capacidades – esse tipo de revolução humana individual é o que possibilita a mudança efetiva em escala global”.

Mostra desconstrói a violência para promover reflexões (Foto: Editora Brasil Seikio/Divulgação)

Uma das bases da atuação da SGI é a abolição de armamentos nucleares, das corridas bélicas e pelo desarmamento. Neste contexto, os homicídios com armas de fogo no Brasil são um forte sintoma da desigualdade social. Como a entidade percebe a violência no país e o que não está sendo feito para combater esta realidade?

O Japão passou por duas experiências bélicas que se tornaram símbolo da luta pelo desarmamento nuclear e de todo o tipo de violência contra a vida. Entenda “violência” como todo tipo de conflito, desde o comentário maldoso até a utilização das armas nucleares, o mais destrutivo dos recursos de guerra. O devastado cenário da segunda guerra mundial, agravado pelas atrocidades causadas com o lançamento das bombas atômicas sob a população de Hiroshima e Nagasaki, fez surgir no Japão o ideal do humanismo Soka que hoje está presente em quase 200 países. As armas nucleares encontram-se no cume da pirâmide da violência. Conforme a pirâmide se estende para a base atinge o nosso cotidiano. Conflito e desconfiança entre as comunidades, crime, violência e abuso doméstico – tudo isso faz parte da cultura mais ampla da violência. O desejo de todos os associados brasileiros da Soka Gakkai é poder transformar a sociedade... Mais do que criticar o que não está sendo feito, nosso papel é conscientizar cada ser humano de seu papel como agente transformador. A atividades promovidas pela Soka Gakkai estimulam esse papel, visando a Paz, Educação e Cultura. Estimular o potencial criativo por meio da educação e da aprendizagem expande a base de solidariedade e prepara a solução de questões mundiais. Ela (a educação)  nos leva a preencher este campo de coordenadas possíveis com a experiência da empatia que sentimos com a dor dos outros. Nossa capacidade de percepção se aprimora ao aprendermos o contexto e as causas fundamentais de problemas como a degradação ambiental ou a desigualdade humana, os quais, por sua vez, esclarecem e fortalecem a ética para abordar essas questões. A segunda função da aprendizagem é criar coragem de perseverar na adversidade. A consciência da inevitável dor de nossa própria existência, os laços criados pelo caminho percorrido na vida e que nos trouxeram até aqui podem nos despertar para a universalidade da angústia humana, não importam as diferenças de nacionalidade e etnia. É a recusa em ignorar qualquer forma de sofrimento não relacionado conosco que faz a nossa humanidade resplandecer.

Outra forma muito clara de violência é de gênero. Mesmo com dispositivos legais como a lei Maria Da Penha, o Brasil tem altos índices de feminicídio e de agressão de mulheres por parceiros, ex-parceiros e familiares. Como a atuação da SGI, no caso, dialoga com esta triste realidade?

Na proposta de paz de 2014, o dr Daisaku Ikeda cita a resiliência, conceito da física, descreve a capacidade de um material para voltar à sua forma original, modificada por pressões externas. Por analogia, o termo exprime a capacidade das sociedades humanas de se recuperar de impactos severos, destruição ambiental ou crises econômicas. Reconheçamos a importância de cultivar, na convivência diária, o “capital social” de intercâmbios e laços entre pessoas da mesma localidade. Acima de tudo, a força de vontade e a vitalidade das pessoas de uma comunidade são energias fundamentais. Faz dois anos um atirador talibã atingiu a cabeça da jovem Malala Yousafzai quando ela defendia a educação para meninas no Paquistão, sua terra natal. Ferimento quase fatal, mas ela se recuperou de forma extraordinária e continua a clamar pelos direitos das mulheres e o acesso à educação das meninas. No discurso na ONU, em Nova York, em 12 de julho do ano passado, sua convicção foi inabalável: Nada mudou em minha vida, a não ser o fato de que a debilidade, o medo e a desesperança morreram; a força, o poder e a coragem nasceram. (...) Sou a mesma Malala. Meus anseios são os mesmos, minhas esperanças as mesmas, meus sonhos os mesmos.  Apesar das constantes ameaças que recebe, Malala persevera no ardente desejo de que mulheres e crianças que continuam a sofrer maus-tratos, violência e opressão sejam capazes de se levantar e falar por si. Pessoas expostas a calamidades — perigos imprevistos, desastres naturais, crises econômicas ou ameaças persistentes, opressão política, violação dos direitos humanos — correm o risco de sucumbir ao desespero levadas pelo terror, a tristeza ou a dor. No entanto, se abrimos mão da esperança e nos deixamos estagnar pela impotência, não só permitimos que os problemas persistam, como contribuímos, inadvertidos, para que proliferem em outros lugares. Em outras palavras: quem pode suportar o desafio de aflições, sem perder a fé no sentido da vida, transforma a tragédia pessoal num triunfo da humanidade. É um trabalho de criação de valor.

Mostra desconstrói a violência para promover reflexões (Foto: Editora Brasil Seikio/Divulgação)

A SGI também trabalha com uma filosofia de empoderamento do ser humano e pelo direito inviolável de viver. Como a busca por essa cultura da paz se relaciona com o surgimento da entidade?

A Soka Gakkai (Sociedade de Criação de Valores) foi fundada em 1930 pelo educador Tsunessaburo Makiguti , com o intuito de promover a criação de valores humanos por meio da educação. Isso se deu em 18 de novembro de 1930 com a publicação do livro Soka Kyoikugaku Taikei (Sistema Pedagógico de Criação de Valores). Após sua fundação, várias pessoas sentiram-se atraídas pelas idéias de Makiguti e, passados sete anos, em 1937, foi realizada a cerimônia para oficializar a fundação da organização. Incentivar e ser incentivado. Há tempos o juramento de uma pessoa inspira o juramento de outra, desperta a força da esperança, permite que elas permaneçam inabaláveis mesmo diante de grande dificuldade. Este incentivo de vida-a-vida é o coração das reuniões de palestra da SGI. Hoje, nossas reuniões de palestra acontecem em todo o mundo. Pessoas de todos os setores da vida, ultrapassando as diferenças de idade e gênero, posição social e circunstância, reúnem-se como membros de uma comunidade para ouvir a história única de vida de cada indivíduo e a manifestação de seu profundo sentimento. Juntos, os participantes renovam a determinação e o compromisso. Mantendo o mesmo objetivo desde sua fundação, conforme as palavras do dr Daisaku Ikeda: “O espírito [da Soka Gakkai] de valorizar cada indivíduo é enriquecido por mais uma perspectiva: a convicção de que cada pessoa, independentemente de seu caminho de vida ou de sua condição atual, tem a capacidade de iluminar o local onde se encontra no momento”. Cabe a nós construirmos um mundo sem guerras. Cada um deve se perguntar se é meramente uma tarefa impossível, ou se deve continuar a desafiar, mesmo em meio às maiores dificuldades – todo o destino do século XXI depende desta decisão.

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