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Mãe desabafa sobre luta por aborto: “Meu bebê se mutilava no útero”

O bebê sofria da síndrome de bandas ou bridas amnióticas, uma condição rara que provoca lesões ou até amputações no feto

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Divulgação

Há dois anos, a chilena Paola Valenzuela perdeu o chão. Grávida de 11 semanas, descobriu, em sua primeira ultrassonografia, que ela e seu bebê sofriam da síndrome de bandas ou bridas amnióticas, uma condição rara que provoca lesões ou até amputações no feto.

Impedida de fazer um aborto — a lei chilena proíbe o aborto em qualquer circunstância —, Paola precisou esperar o filho morrer. “Vi como meu filho se mutilava enquanto crescia”, contou Paola à BBC Mundo. “Sentia que meu filho estava morrendo, e cada dia de gravidez era uma tortura. Mas também tinha medo de sofrer um aborto espontâneo, e ser culpada por isso. Tinha medo de ser presa.”

Quando estava na 14ª semana de gestação, ela sofreu um sangramento e foi levada ao hospital. De início, os médicos acharam que o bebê tinha morrido. Mas logo a notícia foi corrigida. O coração do bebê ainda batia, mas fora do corpo.

Sem muitas esperanças, Paola procurou apoio na Universidade do Chile. Lá, uma equipe médica analisou a situação, mas descartou qualquer intervenção. A mãe foi logo avisada: do ponto de vista da ciência, não tinha o que ser feito. “Senti muita empatia ali, mas o estado do meu filho era tão horrível que pediam desculpas ao descrevê-lo. Tinha o pescoço e a cabeça abertos.”

Paola completou 22 semanas de gravidez. “Às 7h30, meu filho nasceu”, contou. Ela lembra que todos na sala de cirurgia ficaram em silêncio. “Perguntei aos médicos se seu coração ainda batia, e me disseram que ele nasceu morto”. Perguntaram-lhe, então, se ela queria ver o bebê. Não quis. “Mas me lembrei de que estava inteiro até a cintura, e então pedi que me mostrassem apenas as pernas. Assim, o cobriram, se aproximaram de mim e vi suas perninhas.”

O bebê nasceu no dia 29 de maio e recebeu o nome de Jesus.

Para tentar confortá-la, os médicos insistiam que, de acordo com a ciência, a capacidade de sentir dor não se desenvolve até a 24ª semana de gestação. Mas Paola não se conformava. “Pensava o tempo todo que ele estava sendo cortado. E pedia, por favor, que não se movimentasse, pois estaria se ferindo.”

Na época, Paola buscou assistência psicológica da ONG Miles, que apoia a descriminalização do aborto no Chile, e acabou se envolvendo com a causa.

Diante da pressão social, um projeto de lei tramita no Senado para liberar a interrupção de gestação em três casos: risco de morte para a mãe, inviabilidade do feto ou gravidez resultante de estupro.

Síndrome

A doença consiste em uma rara patologia congênita ocasionada pelo aprisionamento de partes do feto por filamentos fibrosos do saco amniótico no útero. As bridas ou bandas costumam aparecer no primeiro trimestre de gestação, quando a membrana amniótica que envolve o embrião se rompe, produzindo vários cordões.

Se o aborto espontâneo não acontece e o embrião sobrevive, ele vai ficando preso pelos filamentos, que vão provocado lesões em seu corpo à medida que ele cresce. Os fetos podem sofrer ferimentos ou amputações no rosto, braços, pernas ou órgãos vitais, como cérebro e coração.

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