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Corpo aguarda liberação há 10 dias no Imol e servidores relatam descaso

Médicos peritos e APCs ainda relatam condições insalubres.Coordenadoria do órgão e Sejusp negam atraso no Imol de MS.

Materiais são guardados em condições precárias, dizem servidores (Foto: Divulgação/Sinpol-MS)

A demora para a liberação de corpos no Instituto de Medicina e Odontologia Legal (Imol), emCampo Grande, já é considerada histórica entre os servidores. Conforme apurado pelo G1 nesta terça-feira (16), um homem de 71 anos está no local há 10 dias, algo que não ocorria há, pelo menos, uma década. Aliado a este problema, a falta de equipamentos, materiais de trabalho e uma determinação da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) acirra ainda mais o descontentamento de quem trabalha no local.

A coordenadoria do Imol ressalta que não estão ocorrendo atrasos. Já a Secretaria de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul (Sejusp-MS) reafirma que não existem atrasos no local.

Servidores relatam condições insalubres no Imol (Foto: Divulgação/Sinpol-MS)

“Meu pai [o corpo] está lá há mais de uma semana e eu não acho correto esta demora, mas não temos muito o que fazer, pois são inúmeros problemas. O primeiro é que disseram que só tem uma máquina que faz o raio X e ela está estragada, então tem que ser feito em outro local. Enquanto isso, ele fica lá, em avançado estado de putrefação”, afirmou o construtor José Lemes de Castro, de 44 anos.

Um dos médicos legistas que atua desde o ano de 2002 confirma a falta do equipamento de raio-X e relata descaso com os servidores. “Estamos trabalhando diariamente sem ar-condicionado na sala de necrópsia e as bactérias proliferam muito no calor. Recentemente, para fazer uma perícia em um cadáver ferido com 23 projéteis, nós trabalhamos seis horas sem interrupção, em meio a forte temperatura”, comentou o profissional, que prefere não se identificar.

No local, eles ainda trabalham com a falta de materiais, não tendo inclusive o necessário para esterilizar os equipamentos, conforme o médico. “Recentemente uma idosa foi morta e estuprada, sendo o corpo levado para lá. A intenção era provar para o Ministério Público a gravidade das lesões, mas até mesmo uma impressora colorida não temos para explicar a lesão de maneira mais correta. São condições sub-humanas de trabalho, passamos um sufoco”, lamentou.

Não bastasse isto, uma antiga discussão entre médicos e Agentes de Polícia Científica (APCs) está acirrando ainda mais o ambiente. Em dezembro, servidores compareceram à PGE para afirmar não ser da sua competência realizar necrópsia em corpos, sendo este um desvio de função. Os médicos, por sua vez, ressaltam a falta de um auxiliar de necrópsia ou auxiliar de perícia técnica, algo existente em outros estados

“Sempre tivemos a necessidade de trabalhar com um auxiliar e agora recebemos a informação de concurso público para dentistas aqui, algo que nunca teve, apesar de ser chamado de Imol. No entanto, precisamos de radiologistas e auxiliares. É um local também sem condições de trabalho, sem refeitório, repouso e outros locais importantes”, lamentou o médico.

Os APCs então tiveram um parecer favorável no dia 18 de dezembro de 2015. Em sua grande maioria, servidores dizem que gostariam de ser reaproveitados no quadro da Polícia Civil, ressaltando estar sofrendo uma subutilização de mão de obra qualificada.

“Nós temos que tratar de questões de cunho pericial, como buscar familiares de indigentes, realizar a preservação do local do crime, realizar, por exemplo, o procedimento em vítimas de crimes sexuais, entre outras atribuições. Abrir corpo é algo que foi atribuído a nossa cultura, ainda mais em um ambiente insalubre. Por conta disso, está tendo atraso na liberação de corpos, algo histórico e que não ocorria há mais de 10 anos”, afirmou um servidor que atua há uma década no Imol de MS.

O ideal, de acordo com a previsão do Sindicato da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul (Sinpol-MS), são 250 agentes de polícia científica no estado, que atualmente conta com 57 servidores.

“Eles atuam em desvio de função. Necrópsia é um ato médico e que a PGE se manifestou sobre a legalidade da situação. Nós ainda fizemos uma vistoria técnica e informamos, reiteradas vezes, sobre problemas no ar-condicionado, macas enferrujadas, falta de jaleco, autoclave, entre outras”, explicou ao G1 o presidente do Sinpol-MS, Giancarlo Miranda.

Sobre a polêmica, o diretor-geral da Polícia Civil, Roberval Rodrigues, disse que é uma briga interna. “A coordenadoria de perícias pretende ser independente, pois não é ligada nem à PC e nem à Sejusp [Secretaria de Justiça e Segurança Pública], então a intenção é resolver esta questão interna. A partir daí, poderemos resolver este problema da corporação”, avaliou Rodrigues.

Sem atrasoDe acordo com o coordenador-geral de perícias, José Bento Corrêa, não está ocorrendo demora. Os corpos que chegam aqui de vítimas de acidentes de trânsito e hospitais estão sendo liberados sem atraso. O caso deste pedreiro em questão é porque ele já chegou um cadáver putrefeito e por isso permanece na câmara fria. Nós estamos inclusive respeitando um padrão que ocorre a nível nacional, explicou o coordenador.

Ainda conforme Corrêa, sobre o raio-X, ele ocorre por meio de um convênio com o Hospital Universitário. A captura é realizada aqui e a relação é no HU, por meio de um convênio. Em contrapartida, nós recebemos estudantes de medicina para realizarem estágio neste local. O hospital ainda faz a lavagem das roupas do Imol, comentou.

Já a falta de alojamento ele confirma para os médicos. No entanto, os APCs possuem o local de repouso, inclusive com ar-condicionado, de acordo com o coordenador. Os médicos não tem realmente um local de repouso e por isso muitas vezes trabalham de sobreaviso, embora a lei 114 exigir a permanência aqui durante o plantão. Os agentes têm o local, que precisa apenas de reparos, afirmou.

ReuniãoEm nota, a Sejusp disse que o titular da pasta, Sílvio Maluf, se reúne na tarde desta terça-feira com o diretor do Imol e seu adjunto, com o procurador do Estado em exercício nesta pasta, para discutir o tema, já que o pedido de autorização de concurso público para a Coordenadoria Geral de Perícia está sendo analisado.

Com relação ao material de trabalho, vem sendo fornecido conforme as solicitações, todavia alguns produtos dependem de fornecedores exclusivos face às suas particularidades. No que diz respeito às instalações, ainda de acordo com a Sejusp, existe projeto de reformas e adequações do Imol na Secretaria de Estado de Infraestrutura, sendo que a planilha de custos está sendo atualizada.

Quanto ao aumento do quadro de servidores da Coordenadoria Geral de Perícias, depende de concurso público de provas e títulos cuja autorização já foi solicitada ao Governo do Estado, e, pode ocorrer ainda este ano.

Más condiçõesEm fevereiro de 2015, a 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande condenou o estado de Mato Grosso do Sul a cumprir normas de segurança do trabalho, saúde e higiene do prédio do Instituto de Medicina e Odontologia Legal (Imol). A condenação é resultado de ação do Ministério Público de Trabalho (MPT), que denunciou o descumprimento dessas normas. A sentença também prevê multa diária de R$ 10 mil para cada infração encontrada.

De acordo com o Ministério Público, o Imol tem descumprido resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); normas de saúde, higiene e segurança do trabalho expedidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

As irregularidades na sede do Imol na capital sul-mato-grossense vão desde falta de controle do acesso às salas do prédio à iluminação irregular e más condições dos móveis. A condenação também pede reorganização do ambiente de trabalho em um prazo de dez dias a dois anos, dependendo da situação.

As principais solicitações são para ampliação e adequação do espaço físico e mobiliário; fornecimento de equipamentos para as atividades do instituto e a manutenção constante das edificações.

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