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Juventude feminina se insere cada vez mais na busca por igualdade de gênero

Nathalia se espelha em personagens e artistas femininas (Foto: - Valdenir Rezende / Correio do Estado)

Foi-se o tempo em que o Dia Internacional da Mulher era uma data voltada apenas às mães, que recebiam homenagens dos alunos nas escolas. Nos últimos anos, a data vem sendo celebrada por mulheres cada vez mais jovens e lutadoras. Conscientes sobre a desigualdade de gênero, violência contra a mulher, salários inferiores, falta de representatividade, machismo e outras mazelas da sociedade, a mulher jovem, hoje, não tem mais medo de se definir “feminista” e demonstrar orgulho de seu gênero.

O Correio B conversou com jovens mulheres que buscam fazer a diferença, seja divulgando feitos históricos femininos, promovendo encontros de empoderamento entre mulheres ou, simplesmente, reconhecendo e valorizando o poder da mulher na mídia e cultura.

HISTÓRIA 

A campo-grandense Sigrid Beatriz Varanis Ortega, 18 anos, mais conhecida como Bia e que atualmente mora em São Paulo, é um grande exemplo sobre o nível de conscientização e engajamento desta nova geração de mulheres.

Mesmo com a pouca idade, Bia comanda o projeto “As Minas na História”, uma página no Facebook que divulga os feitos de mulheres ao longo da história. Atualmente, mais de 146 mil pessoas acompanham as publicações.

A ideia surgiu após uma participação da Olimpíada Nacional de História do Brasil. “Apareceu uma foto da Maria Bonita, que eu nunca tinha visto antes”, relata. “Eu me interessei e pesquisei sobre ela. Essa busca trouxe a reflexão de que, em toda a minha vida escolar, pouquíssimas vezes tinha aprendido sobre as mulheres e seus feitos.”

Hoje, a “As Minas na História” divulga a trajetória de personalidades como Margaret Hamilton, responsável por criar código essencial para a viagem do homem à Lua, e Sophie Scholl, uma das fundadoras do grupo de resistência não violenta antinazista, chamado Rosa Branca.

“Quero fazer com que mulheres se inspirem, se sintam representadas e encorajadas. Essas personagens que atravessaram séculos mostram toda a resistência  que trazemos no nosso corpo, toda a luta por direitos básicos”, avalia.

Muitas meninas entram em contato com a Bia para agradecer. Se não fosse a página, elas jamais conheceriam a existência de tantas mulheres corajosas e inteligentes. De acordo com a estudante, os feitos femininos foram constantemente apagados ou ignorados por historiadores.

Ela cita o caso de Cecilia Payne, que foi a primeira pessoa a descobrir que o sol era composto de hidrogênio, mas teve seu trabalho copiado e publicado por outro cientista, que levou todo o crédito. “O mesmo aconteceu com Lise Meitner, Nettie Stevens, Camille Claudel e outras inúmeras mulheres. Esse é um fenômeno sociocultural, fruto da desigualdade de gênero e, lamentavelmente, de uma sociedade machista, que diminui e apaga mulheres apenas por serem mulheres”, lamenta.

O trabalho de Bia fez com que ela fosse convidada a ajudar a escrever um projeto editorial feminista. “Estou apenas começando”, promete.

PRECONCEITO

A professora Angela Batista, 22 anos, ganhou manchetes em todo o Brasil, após lutar contra o preconceito que sofreu durante o Carnaval. Da Capital, Angela postou um desabafo em uma rede social: um colega de trabalho havia lhe enviado uma mensagem, avisando que usaria uma fantasia de “Angela” durante a folia.

Negra, Angela percebeu que o colega pretendia usar “blackface” e sair às ruas se passando por uma mulher negra. O “blackface” é uma prática historicamente utilizada por atores brancos, para imitar e ridicularizar os negros.

A voz de Angela circulou nas redes e chegou até grandes portais, como a BBC, que reproduziram sua história.Com apenas 22 anos, a professora se tornou um símbolo do ativismo feminista e negro de Mato Grosso do Sul, ajudando a organizar encontros, em Campo Grande, de mulheres que se orgulham dos seus cabelos crespos e cacheados – e é mais uma prova de que as mulheres estão se conscientizando cada vez mais cedo.

“[Atualmente] eu vejo mulheres lutando a favor de sua liberdade de expressão e sobre o direito de agir como bem entendem sobre seus corpos. Vejo mulheres com sede de politização, de justiça, de igualdade”, reflete Angela. “Gosto de pensar que essas mulheres estão lutando pelo direito de ser mulher”, diz.

Ela conta que se libertou das opressões ao assumir seus cabelos crespos, sua identidade natural. “Aprendi muita coisa quando o ativismo negro e o feminismo bateram à minha porta. Sou muito grata por todas as mulheres que me ensinaram a ser forte”, enfatiza.

Neste 8 de março, o apelo de Angela é por um mundo mais justo e igualitário. “Já faz alguns anos que eu vejo esta data com outros olhos, uma olhar menos infantil.”

REPRESENTATIVIDADE

Cada vez mais conscientes sobre o seu papel na sociedade, as mulheres também passam a se espelhar em personagens femininas fortes e empoderadas. A analista de sistemas e ilustradora Nathalia Borine, 24 anos, é fã de heroínas como a Mulher-Maravilha e Jessica Jones, além de acompanhar personagens fortes do cinema e da literatura, como a destemida Katniss, da série “Jogos Vorazes”. Na música, o ídolo de Nathalia é a cantora Joan Jett, líder de banda de rock The Runaways, que teve seu auge nos anos 1970.

“Se inspirar em uma pessoa, seja real ou fictícia, é melhor quando há identificação de gênero”, argumenta. “E te faz sentir capaz de tudo, mesmo sendo uma mulher em um mundo dominado pelo sexo masculino”, complementa a ilustradora.

Ano passado, mulheres se destacaram com papéis fortes, em produções que geralmente são ocupadas por homens. O novo volume de “Star Wars” ganhou uma protagonista mulher; o popular filme de ação “Mad Max: Estrada da Fúria” tinha a atriz Charlize Theron como uma das principais personagens; sagas de ação e fantasia foram comandadas por jovens corajosas (“Divergente”, “Jogos Vorazes”); e as heroínas estão finalmente ganhando espaço, como nas séries “Jessica Jones” e “Supergirl” e no primeiro filme da “Mulher-Maravilha”, previsto para estrear ano que vem. Elas também começam a dominar as bilheterias de comédia e thriller policiais e de ficção científica. Publicações relevantes, como o The Hollywood Reporter, chegaram a afirmar que 2015 foi delas e que 2016 seria ainda mais feminino.

Mesmo com estes avanços, Nathalia sabe que ainda há um longo caminho a se percorrer. “Acho que ainda é pouco”, opina. Segundo um estudo de 2014, do Instituto Geena Davis, do Gênero na Mídia, tanto nos EUA quanto no Reino Unido, apenas 30% dos filmes de maior bilheteria tinham protagonistas ou coprotagonistas mulheres. E as  latinas e negras quase não aparecem nas porcentagens.

Apesar das dificuldades, a nova geração sabe o que precisa ser feito para suscitar a mudança e promover a igualdade. “A heroína na cultura popular fará as meninas se sentirem capazes de qualquer coisa, e grandes representações femininas na cultura pop fazem os garotos respeitarem mais as mulheres, enxergando-as também como iguais”, define Nathalia.

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