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TSE não pode ignorar pesquisas tendenciosas. Porque não aplica a mesma conduta para as "Fake News" ?

Sob o comando de Alexandre de Moraes, TSE gera desconfiança na equipe bolsonarista

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Divulgação

Três professores de estatística foram caçar lebres na floresta. Ao chegarem, logo viram uma. O primeiro professor dispara um tiro… um metro à direita da lebre. O segundo dispara um tiro… um metro à esquerda da lebre. O terceiro, então, exclama: “Nós a pegamos”. Lembrei da piada italiana ao comparar os resultados das urnas no primeiro turno da eleição presidencial e os de pleitos estaduais com os números das empresas de pesquisa divulgados na véspera (vamos tratar como empresas, não como institutos, que é o que elas são). As que se autoproclamam as mais confiáveis, mas não apenas elas, erraram escandalosamente.

O Datafolha mostrava Lula com 50% e Jair Bolsonaro com 36%, uma diferença de 14 pontos – 14 pontos, enfatize-se –, com margem de erro de 2 pontos. O Ipec apontava o petista com 51% e o atual presidente com 37%, dentro da margem de erro idêntica à do Datafolha. Ao final da apuração, Lula tinha 48% e Jair Bolsonaro, 43%. A diferença de 14 pontos era, na verdade, de apenas 5. Uma das que erraram menos foi justamente a mais atacada pelos antibolsonaristas: Paraná Pesquisas, que dava o petista com 47% e o atual presidente com 40%. Em estados como São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, a vergonha se repetiu.

O que deveriam ter feito as empresas de pesquisa? Reconhecido o erro. Não foi o que ocorreu. Elas correram a dizer que acertaram a lebre, porque, sabe, pesquisa é retrato do momento, eleição é filme – e que, afinal de contas mal feitas, não há do que reclamar, visto que as pesquisas deram Lula em primeiro, Jair Bolsonaro em segundo, Simone Tebet em terceiro e Ciro Gomes em quarto.

Mas e quanto aos números absurdamente díspares de Jair Bolsonaro? Vieram com a história de que houve uma súbita migração de votos em massa em 24 horas, porque os eleitores de direita ou apenas antipetistas, ao serem confrontados com a possibilidade de Lula ser eleito em primeiro turno, fizeram “voto útil”, antecipando o voto em Jair Bolsonaro e desidratando as candidaturas de Simone Tebet e Ciro Gomes. Mais: as empresas deram a entender que, como também os seus números teriam movido os indecisos a se decidirem pelo “voto útil”, elas até contribuíram com boa informação para o resultado de domingo. O argumento foi replicado para explicar os absurdos nos estados. Ou seja, acertaram porque erraram.

O aspecto que deveria acender o alerta no TSE é que, se é verdade que as pesquisas anteciparam o “voto útil” em Jair Bolsonaro, prejudicando Simone Tebet e Ciro Gomes, e se o fenômeno ocorreu também em votações para governador e senador, isso significa que as empresas exerceram uma influência indevida no processo eleitoral.

E, diante da explicação das empresas, como garantir que não pudesse acontecer o oposto, o de dar um empurrão em Lula? O primeiro turno de uma eleição serve para que os eleitores expressem as suas convicções ou simples simpatias, o que permite a candidatos e partidos verificarem a sua real representatividade. Se os cidadãos se veem compelidos a deixar as suas convicções de lado por causa de pesquisas, há uma distorção no tempo e no espaço que prejudica a democracia.

O leitor pode perguntar-se: mas como é que as pesquisas seriam capazes de detectar o voto envergonhado? Não sou estatístico caçador de lebres, mas afirmo que, se as empresas não têm como montar um questionário que possa verificar se a declaração de intenção de voto bate com o perfil ideológico do sujeito, para descartar aquelas que não coincidem, é melhor mudar de negócio.

É uma ideia de jerico criminalizar empresas que divulgam pesquisas eleitorais que, confrontadas com os resultados das urnas, apresentem resultados fora da margem de erro previamente estabelecida. Não é ideia de jerico, contudo, o TSE tratar as pesquisas com o mesmo rigor com que lida com as fake news da tia do zap. Seria importante que o tribunal dissecasse as metodologias e definisse, juntamente com as empresas, padrões de procedimento comuns para pesquisas presenciais, telefônicas e telemáticas, a fim de diminuir a chance de cometimento de erros clamorosos.

Também seria aconselhável proibir a divulgação de levantamentos na véspera da data da eleição, como faz a França, que conta ainda com uma comissão – escolhida pelos três poderes – encarregada de fiscalizar o andamento das pesquisas eleitorais. Menos estridência implica mais consciência.

A difusão de números errados interfere nas escolhas dos eleitores, desencoraja o financiamento de candidatos prejudicados por elas, enquanto encoraja os beneficiados e desanima comandantes de campanhas e os seus cabos eleitorais. Além de propiciar, é claro, a propagação de teorias conspiratórias, como a de que as grandes empresas de pesquisa brasileiras sempre pendem em favor dos candidatos de esquerda (o que, imagino, deve ser só coincidência). Tudo isso é muito ruim para a democracia. Só é bom para algumas lebres.

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