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Fazendeiros relatam “Inferno de Dante” na região do Rio Miranda

Fogo se espalha pela região que, sem chuvas, tem vegetação destruída; situação no Parque do Ivinhema também preocupa

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Os incêndios que desde a semana passada se espalham pelo Pantanal, nas regiões do Passo do Lontra –entre Aquidauana, Corumbá e Miranda– e do Rio Negro, constroem uma paisagem que, na visão de quem vive naquelas regiões, confunde-se com “o Inferno de Dante”. Foi a descrição dada por um pecuarista em vídeo que circula em redes sociais. E, no roteiro vivenciado pela comunidade pantaneira, muitas cenas se repetem: fumaça que toma estradas e toma a visibilidade, animais em fuga e matas calcinadas; além de tempo seco por, pelo menos, uma semana.

Esta obra de ficção encarnada na realidade, porém, conta com apreensão de quem a acompanha e de seus protagonistas para que o final chegue logo. Reforços para ajudar no desfecho devem chegar ao Estado na quarta-feira (6), segundo informou ao Campo Grande News o tenente-coronel BM Fábio Catarinelli, coordenador estadual da Defesa Civil. “Fizemos o acionamento do pessoal do Corpo de Bombeiros de Brasília, que deve sair de lá na quarta-feira. Serão mais 27 homens, que vão se somar aos 8 que já vieram. Um avião de apoio (Air Tracker) já chegou no sábado (2)”, explicou ele.

A força-tarefa usada na ação, hoje, tem 120 homens (70 do PrevFogo e 50 bombeiros), três aeronaves Air Tractor (dois do ICMBio e um dos bombeiros de Mato Grosso) e três helicópteros (Polícia Militar, ICMBio e Polícia Rodoviária Federal).

A Sala de Situação Integrada montada para coordenar o combate às queimadas ainda não atualizou os dados sobre a dimensão da destruição. A última contagem apontava 122 mil hectares de vegetação incinerados. “Seguimos com pessoal em campo, fazendo os atendimentos in loco e acompanhando as condições climáticas”, reiterou Catarinelli, apontando que a ajuda dos céus por meio de chuva é aguardada para ajudar na contenção de danos.

As previsões que pautam os trabalhos da Operação Pantanal 2 –nome da ação emergencial–, porém, não são animadoras. Não há perspectiva para os próximos dias de chuvas significativas, isto é, em quantidade suficiente para extinguir as chamas. Além disso, ventos fortes, vegetação seca e baixa umidade do ar criam condições para o fogo se alastrar mais facilmente. O Cemtec (Centro de Monitoramento do Tempo, do Clima e dos Recursos Hídricos) prevê que o tempo segue seco no Pantanal nesta semana, com temperaturas elevadas. A partir do dia 11, porém, devem ocorrer chuvas acima das médias.

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O reflexo das queimadas é sentido por quem vive no local. Em gravação encaminhada à reportagem na região da Fazenda Monte Castelo –próxima ao Rio Miranda, a noroeste do município de mesmo nome e vizinha à BR Pec, que serviu de base para as ações na região e também foi prejudicada pelos incêndios–, um condutor relata a dificuldade em circular em meio ao calor e fumaça. “Parece o ‘Inferno de Dante’”, considerou –na literatura, o termo cita a primeira fase da “Divina Comédia” que retrata os nove círculos do mundo inferior; e nos cinemas, o pânico de uma cidade causado pela explosão e um vulcão.

Em outras imagens, animais, indecisos, não sabem para onde correr em meio à mata queimada.

O funcionário de uma propriedade rural, que preferiu não se identificar, relatou que o fogo no lado esquerdo do Miranda, que havia se espalhado por 7 mil hectares na sexta-feira (1º), “já deve ter chegado a mais de 15 mil hectares”. “Já tem língua de fogo com mais de um quilômetro e passando o rio”, afirmou. Brigadistas de fazendas da região se unem para ajudar no enfrentamento ao fogo. Outros relatos destacam que os ventos, de 40 km/h, tornam o controle do fogo quase impossível.

Na região, brigadistas cedidos por fazendas trabalham na formação de aceiros e trilhas de acesso, na esperança de barrar o caminhar das chamas. Espera-se que, nesta noite, a Monte Castelo seja barreira para conter o avanço da queimada. “Os brigadistas estão ali com caminhões-pipa e abafadores para a contenção”, disse um funcionário de uma fazenda vizinha, alertando que, também nesta noite, o fogo pode se aproximar da BR-262, novamente tornando a circulação de veículos perigosa, pela falta de visibilidade e fuga de animais.

Somente uma das fazendas da região –a Bodoquena– mobilizou 40 pessoas para ajudar. Além disso, a propriedade se tornou abrigo para equipes de combate às chamas e cedeu vários tratores para o trabalho. Funcionários relataram que, em 33 anos, “este é o pior incêndio que já vi por aqui”. “É um cenário de guerra”, complementa outro trabalhador.

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Estratégia – nesta segunda-feira, o governo estadual reavaliou as ações de combate a queimadas e decidiu remanejar o grupamento de aeronaves que atuam nos três municípios e, também no entorno do Parque Nacional das Margens do Rio Ivinhema, no sul do Estado –na divisa com o Paraná. “Já deslocamos uma equipe para proteger o Parque de Ivinhema”, destacou o coronel BM Joílson Amaral, segundo quem o novo planejamento permitirá ações mais rápidas. Além disso, ele informou que os quartéis nas áreas mais críticas seguem em prontidão.

“A situação é extremamente preocupante. Novos focos surgiram de domingo (3) para cá, e decidimos intensificar os combates por terra e ar, de forma coordenada, onde contamos com o apoio do Exército na parte logística”, informou o secretário Jaime Verruck (Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar). “Fizemos um planejamento para a semana com base nas previsões meteorológicas, sabendo que será uma semana crítica com o ponto de vista dos combates devido à ausência de chuvas e altas temperaturas”, destacou, via assessoria.

Segundo Verruck, este é o período de maior estiagem –em Ladário, no coração do Pantanal, a régua do Rio Paraguai apontava 1,20 de profundidade, quando, no mesmo período do ano passado, chegara a 2,60 metro. Trata-se de um dos menores índices nos últimos 20 anos.

Apesar da mudança de estratégia, o Pantanal concentra a maioria dos incêndios: dos 2.228 focos contabilizados até esta segunda-feira, 2.088 (92%) estão entre Corumbá, Aquidauana, Miranda e Porto Murtinho. O Passo do Lontra, onde o problema persiste, continua a registrar novas queimadas.

Já na região do Forte Coimbra, entre Corumbá e Porto Murtinho, o fogo foi controlado na região da Fazenda Piúva, permitindo que equipes também sejam mobilizadas para outras áreas em perigo.

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