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Idosa que vivia como homem usou documento falso para registrar filhos e só será enterrada com 'fim do mistério'

A polícia de Campo Grande (MS) segue na investigação da real história de Lourival Bezerra de Sá, de 78 anos

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O pintor Lourival Bezerra de Sá viveu em Ituverava (SP) na década de 1970 — Foto: Reprodução/TV Globo

A polícia de Campo Grande (MS) segue na investigação da real história de Lourival Bezerra de Sá, de 78 anos, que morreu há exatos 4 meses. O corpo está no Instituto de Medicina e Odontologia Legal (Imol) da capital desde 5 de outubro de 2018, aguardando documentação para que seja liberado. Segundo a polícia, a demora é porque, biologicamente, Lourival era uma mulher, que não possui registro nem em nome Lourival, nem no que seria seu nome de nascimento, Enedina Maria de Jesus.

De acordo com a delegada responsável pelo caso, Christiane Grossi, pessoas da região sul e nordeste do país entraram em contato com a Polícia Civil de MS acreditando que Lourival, ainda com a identidade de Enedina, poderia ser um familiar desaparecido: "São pessoas esperançosas por saber o paradeiro de um parente, e essa pode ser a chave para o mistério, e para o fim da angústia da família de Lourival em Campo Grande", afirma Grossi.

A pessoa que viveu por mais de 40 anos com aparência masculina em diversas cidades e, por último, na capital sul-mato-grossense, registrou seis filhos com documento emitido de forma correta, porém com dados falsos, de acordo com a polícia. Segundo a delegada, a liberação do corpo só será possível com o fim do mistério em torno de sua história real, porque nem Lourival Bezerra de Sá, nem Enedina Maria de Jesus, têm documentos verdadeiros. Ele não tinha qualquer registro de nascimento:

"Pode ser um caso de identidade de gênero diversa do sexo biológico, no entanto, a investigação não pode se fechar somente nessa vertente, pretende também levantar a possibilidade dele estar fingindo uma identidade masculina para esconder alguma situação, questão de trabalho ou algum crime, por exemplo. A gente não sabe, ainda, a origem destas crianças [filhos de Lourival] que foram registradas de forma equivocada. A pessoa não pode, simplesmente, acordar e dizer: 'Agora sou Lourival' e sair por aí praticando atos da vida civil como Lourival, existe uma questão legal que precisa ser observada e isso vale para qualquer cidadão", afirmou ao G1 a delegada Christiane Grossi.

Conforme a polícia, Lourival registrou ao todo seis filhos. Segundo as investigações, nenhum dos filhos sabia que o pai era, biologicamente, mulher: "Ele era uma pessoa que não frequentava nem o médico, trancava portas para ir ao banheiro, e nem sequer dentro da família, alguém sabia dessa situação. Só poucos dias antes de morrer é que tudo foi descoberto pela cuidadora, que recebia para cuidar dele, eles não mantinham um relacionamento amoroso", ressaltou a delegada.

Com o intuito de desvendar o mistério, Grossi explica que a questão da identidade de gênero não é o foco da investigação. "Na época em que ele trocou o nome, não existia a possibilidade de se fazer essa troca de forma legal, o que se pretende é saber quem é a pessoa que existia antes de Lourival", afirma.

Segundo a delegada, outro ponto importante da investigação diz respeito aos filhos de Lourival, registrados com um documento ideologicamente falso, ou seja, emitido por órgão público e em papel verdadeiro mas contendo dados falsos. Para a polícia, esse segredo guardado por décadas interfere na vida de 6 pessoas que agora descobriram que não conhecem, de fato, a própria história:

"As crianças que ele registrou hoje são adultas, nasceram em outras cidades e precisam entender a sua origem. Dos seis, dois tiveram a cuidadora que vivia com ele como mãe. Já os outros quatro não sabem sua história anterior ao registro. A mãe que consta na certidão de nascimento dos filhos morreu e Lourival não tinha contato com esses filhos desde 1980, quando eram crianças", explicou.

Para a delegada, o fato de Lourival jamais querer legalizar a identidade que escolheu, diz algo sobre seu interesse em esconder quem ele realmente era. Nos locais em que apontou ter nascido, em Alagoas e Pernambuco, não há registros de nascimento nem de batismo em nome de Enedina Maria de Jesus.

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