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Em Ribas do Rio Pardo garotas assumiram o PCC, rival queria comer coração de ‘irmã’ para ser chefe

Facção recruta cada vez mais meninas pobres das periferias com promessa de poder e riqueza

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Divulgação

Cada vez mais, garotas em situação de vulnerabilidade econômica e social consideram a vida no crime como opção de futuro. Nas periferias de Campo Grande e pequenas cidades sul-mato-grossenses, muitas meninas se dizem dispostas a ‘fazer o que for preciso’ para entrar no PCC (Primeiro Comando da Capital), facção criminosa que tem ganhado força no narcotráfico em Mato Grosso do Sul.

A iniciação no crime, que antes acontecia através de paixões por namorados já implicados com a bandidagem, ganhou contornos de independência. Foi assim que em Ribas do Rio Pardo, cidadezinha com pouco mais de 13 mil habitantes, jovens garotas assumiram as operações de uma célula do PCC.

A 103 quilômetros de Campo Grande, Ribas tem posição estratégica para o narcotráfico. Fica às margens da BR-262 no sentido de quem atravessa Mato Grosso do Sul da fronteira com o Paraguai para as divisas com São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.

Ao desarticular a célula da facção, a Polícia constatou que as meninas faziam o transporte de drogas para narcotraficantes ligados ao ‘1533’. “Neste caso ficou claro que quem comandava na cidade eram as meninas”, conta o delegado de Polícia Civil Ricardo Salomão, da Denar (Delegacia Especializada de Narcotráfico).

“De uns anos para cá a entrada das meninas nas facções criminosas está crescendo”, constata.

Disposta a comer o coração da ‘irmã de facção’

Segundo o delegado, na vida do crime as garotas se submetem aos mesmos riscos e disputas que os homens. Em Ribas do Rio Pardo, por exemplo, a Polícia salvou uma garota de ser executada por uma ‘irmã de facção’ que estava de olho no cargo dela dentro do PCC.

A integrante da facção chegou a revelar que mataria a colega degolada, arrancaria o coração dela e comeria. Tudo para ter o posto da rival. A polícia conseguiu impedir a execução da vítima. Para os grandes chefões da facção, essas disputas internas são parte do cotidiano, fatos de menor importância. “Existe um grande consórcio feito pela facção que só pensa em dinheiro. Eles têm grande organização e estrutura”, diz Salomão.

Promessa de riqueza, vida de pobreza

Carro, casa, dinheiro sobrando, vida fácil e sem preocupações, além do poder de decidir pela vida ou morte de alguém: promessas que não têm nada a ver com a vida real dos pobres envolvidos com o narcotráfico em MS. Mesmo assim, estão levando muitos jovens a sonharem com a vida na bandidagem.

Na prática, a vida dos ‘soldados’ recrutados para trabalhar com a venda direta ou para traficar como ‘mulas’, não rende nenhum glamour na periferia de Campo Grande e cidades do interior de Mato Grosso do Sul.

Os ‘pebas’, como são chamados, geralmente andam com carros ou motos velhas, moram em barracos ou casas de vila alugadas que abrigam bocas de fumo, e sempre com dinheiro contado. A preocupação com não perder perder o que é dos traficantes maiores é uma constante, pois todos sabem que é muito fácil desagradar e morrer pelas mãos dos próprios ‘irmãos de facção’.

A cooptação de garotos e garotas para facção criminosa acontece nas portas das escolas, praças, campinhos de futebol, churrascos familiares ou nas rodas de tereré, sempre tendo os mais pobres como alvo.

“Enquanto para muitos adolescentes não há opções de trabalho, o crime organizado promete pagar muito bem e durante pouco tempo chega a oferecer ganhos de até R$ 1 mil por semana”, relata o delegado da Denar.

Mas, a vida de sonho dura pouco.

A maioria dos garotos morre jovem em brigas por controle de pontos de venda, ou para medir poder, e quem sobra acaba ‘caindo’ e indo para Unei ou cadeia. É um ciclo de vida conturbado, mas para quem não tem nenhuma expectativa com outra realidade, só resta se iludir e sonhar com o falso glamour que apenas narcotraficantes ricos, chefes de grandes organizações, conseguem.

Falta perspectiva, sobra ilusão

O trágico caminho para a marginalidade social é igual para meninos e meninas.

“Geralmente a apresentação a este mundo que no primeiro momento parece dos sonhos acontece muito cedo, antes dos 10 anos de idade, quando convivem com pais usuários e muitos começam a usar drogas. Lá pelos 15 anos, sem opção de trabalho e renda, e sem oportunidade de estudo, alguns ingressam na rotina no narcotráfico como olheiros para gerentes das bocas de fumo nos bairros”, conta Salomão.

Em Campo Grande, nos últimos anos, ficaram mais comuns os casos de garotas recrutadas. Algumas acabam nesta vida do crime ainda adolescentes, depois de se apaixonarem por integrantes da facção, e outras pela falta de perspectiva e ilusão com as promessas, segundo o delegado.

“Sempre com promessas de dinheiro e vida fácil. A maioria destes adolescentes são muito inteligentes, articulados, e dariam ótimos empresários, delegados de polícia”, lamenta Salomão.

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