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O PMDB deve começar a repudiar algumas predileções do petismo, diz Fábio Trad

Considerado o mais atuante na Câmara, ele fala das divergências que abalaram relação dos partidos

A tensa relação entre PT e PMDB, aliados em nível nacional e rivais históricos em Mato Grosso do Sul, é um dos temas desta entrevista com o deputado federal Fábio Trad (PMDB). Atualmente, há um inconformismo dentro do partido que não concorda com algumas preferências do governo petista, e muitos políticos já não se sentem representados pela cúpula. Segundo o parlamentar, há clara divergência entre as ideologias, o que gera uma percepção de que o PT tem pelo PMDB apenas apreço pela quantidade de tempo na TV. Saindo do tensionamento no campo político, Fábio Trad tem se destacado em seu mandato, como um dos campeões de presença nas sessões da Câmara e pela presidência da comissão do novo Código de Processo Civil, considerado o projeto mais importante da legislatura.

O senhor foi considerado pelo DIAP como o mais atuante deputado federal de MS e um dos campeões de presença nas sessões da Câmara dos Deputados, no ano passado. Como destaca o trabalho que está executando?

Vou às sessões porque devo, posso – Deus me dá a graça da saúde – e gosto. Acho que exercer um mandato compreende a vigilância permanente dos temas debatidos e votados no Parlamento. São projetos que têm a força de mudar a vida das pessoas. Estar presente nas sessões é a única forma de atuar para mudar os rumos de discussões, influenciando na votação. Meu trabalho parlamentar busca espaços políticos para aprovar projetos que melhorem a vida dos meus semelhantes. Sem esse objetivo, parece-me que a política não tem sentido algum.Quais atividades desenvolvidas o credenciam para concorrer novamente ao cargo de deputado federal?

Procuro me afastar deste raso consequencialismo, porque reduz a dimensão política do trabalho parlamentar. Se eu reduzisse o mandato à preocupação obsessiva com a reeleição, perderia a autonomia para atuar de acordo com meus princípios e convicções, e passaria a dialogar com o oportunismo. Meu foco está em contribuir modestamente com o resgate da credibilidade da política por meio do trabalho parlamentar, com resultados efetivos na vida das pessoas. Muitas leis aprovadas para as quais contribui com meu esforço e dedicação já estão em vigor, beneficiando milhões de brasileiros. Isto é o que importa.Em fevereiro, o senhor assumiu a vice-presidência da Comissão de Constituição e Justiça, considerada a mais importante da Casa. Quais são os principais desafios nesta função?

O principal desafio é o tempo. Este ano é atípico (Copa e eleições), por isso defendo posição mais proativa e audaciosa da comissão, para intensificar uma pauta arrojada de votações de projetos que, aprovados, melhorem a vida das pessoas. Tem um vasto campo temático para explorar na CCJ a fim de atender às demandas da população. Temos que trafegar por este caminho. Lembro-me que, quando assumi a presidência da comissão do novo Código de Processo Civil, muita gente dizia que eu não conseguiria fazer o projeto andar porque ele é muito complexo, extenso e atinge muitos interesses poderosos. Graças às bênçãos divinas, tive a felicidade de conseguir sensibilizar o colégio de líderes e o presidente Henrique Alves para a magnitude do projeto e, hoje, ele é considerado o principal projeto de lei de toda a legislatura.Recentemente, o PMDB declarou posição de independência em relação ao governo federal. Esse posicionamento já está definido?

A aliança nacional entre PT e PMDB precisa ser constantemente discutida para reavaliações de sua qualidade política. Sempre considerei que aliança política é comunhão de poder e compartilhamento de responsabilidades. Há momentos em que o PMDB precisa frear as pretensões hegemônicas decorrentes da vocação monopolista do “petismo” para que a democracia seja garantida pelo equilíbrio das forças políticas. Mas o problema maior é a falta de sinergia ideológica entre os partidos que se agrava com o acirramento das disputas eleitorais em vários Estados da Federação. Há, igualmente, uma forte percepção de que o PT tem pelo PMDB apenas apreço por sua quantidade de tempo na TV e não por sua expressão ideológica.Na sua avaliação, qual deve ser a principal consequência de eventual ruptura da aliança com o PT, principalmente nas eleições deste ano?

Não acredito, por enquanto, em ruptura, porque ainda prevalecem no PMDB forças que preferem a zona de conforto do poder ao fortalecimento substantivo do partido enquanto expressão ideológica. Porém, focos de inconformismo dentro do partido são cada vez mais numerosos e protagonizados por uma nova geração de políticos, que não se sentem representados pela cúpula. Tenho a impressão de que um processo de transformação ocorre nas entranhas do PMDB e, em breve, novas forças passarão a ditar os rumos do partido.O PMDB caminha para formalizar quais alianças no pleito deste ano?

Defendo um diálogo com as forças ideológicas do centro. Acho que o PMDB precisa ter coragem para abrir novos horizontes políticos. O PT e o governo federal têm virtudes, mas o “petismo”, que é diferente, precisa ouvir algumas verdades do PMDB se quiser, de fato, que a aliança seja honesta politicamente. Acho que o PMDB deve começar por repudiar expressamente algumas claras predileções do “petismo” reveladas, por exemplo, na leniência com o desrespeito ao direito de propriedade, na afrouxada postura de combate ao crime, na anêmica disposição de fortalecer e valorizar as carreiras de estado, na dúbia política em relação à repressão ao uso e comércio de drogas, no confuso posicionamento em relação à Cuba e Venezuela, na tímida defesa dos valores centrais da família, enfim, muitos pontos que tensionam a relação com o PT e precisam ser postos na mesa. O PMDB tem que abrir o jogo e falar abertamente com o PT a respeito destes focos de tensão. Não aceito chamar de casamento uma relação entre quem não dialoga durante o dia e à noite dorme em quartos separados.

O PT declarou que deve mesmo unir-se ao PSDB nas eleições. O PMDB ainda mantém interesse em aliar-se aos tucanos?

Nos anos em que PMDB e PSDB se uniram, viu-se progresso, harmonia e crescimento na administração. Milhares de pessoas foram beneficiadas com a aliança entre PMDB e PSDB. Campo Grande é prova desta afirmação. Acho que a união entre PMDB e PSDB seria mais respeitosa com a história dos dois partidos e mais coerente no plano ideológico, mas não me cabe dizer o que o PSDB deve ou não fazer. Posso e devo constatar, porém, que, na Câmara e no Senado, PT e PSDB não se misturam, vivem às turras e divergem em quase todos os temas, inclusive aos sábados, domingos, feriados e dias santos. Água e óleo.Como avalia os acontecimentos recentes em Campo Grande, que resultaram na cassação do prefeito Alcides Bernal?

Não tenho razões para descrer do juízo político dos vereadores e vereadoras do SDD, PSDB, PSD, PSB, PT do B, PSC, PMDB, DEM, PR, PSL, PRB e do próprio PP que, por maioria absoluta, concluíram que houve infrações administrativas graves. Sobre a postura política do ex-prefeito, parece-me que errou na estratégia política de governar sozinho. Ganhar sozinho é possível; governar sozinho, não. Não se governa humilhando e aviltando o Legislativo, porque o centro nervoso da política reside no Parlamento, que é a base sobre a qual se erige todo o edifício do sistema governamental. Acredito que um mandato se constrói todos os dias em um esforço permanente para a sua legitimação. Sem diálogo, não se faz governo e só governa quem respeita a política. 

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