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Cigarro eletrônico não trata tabagismo e ainda traz riscos graves à saúde

Existem outras formas de tratar o tabagismo --e elas não envolvem o uso dos cigarros eletrônicos

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Imagem: iStock 

Ele ganhou novos formatos, cores e "sabores", mas o cigarro eletrônico (ou vape) já é um antigo conhecido. Desde que surgiu, vem cativando cada vez mais adeptos. Há muitos que começam a usar os DEFs (dispositivos eletrônicos para fumar) por pura curiosidade, enquanto outros tentam utilizá-los como substituição do cigarro "tradicional", de papel. E, de fato, os cigarros eletrônicos possuem uma quantidade menor de substâncias tóxicas do que os cigarros analógicos. No entanto, ele não é inofensivo, tampouco "saudável", embora a indústria por trás dele tente passar essa ideia.

Cientistas já identificaram diversos componentes tóxicos e cancerígenos na composição desses dispositivos, entre eles a nicotina, presente na grande maioria, sendo a droga responsável por causar dependência. 

O ponto é que esses produtos, vendidos facilmente principalmente na internet, com um preço acessível, dependendo do modelo —com média de R$ 80 os descartáveis—, são proibidos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no Brasil, o que dificulta o controle de sua comercialização e até que mais estudos sejam feitos. Sua liberação, inclusive, é vista com preocupação.

Cigarro eletrônico ajuda a parar de fumar? Esse ponto é bem polêmico, já que diversas pessoas relatam que, sim, elas conseguiram largar o cigarro convencional por meio dos vapes. Quem defende esse argumento utiliza um estudo de três meses realizado no Reino Unido, publicado em 2019 no The New England Journal Of Medicine, que mostrou que os cigarros eletrônicos, juntamente com intervenções comportamentais, ajudaram os fumantes a parar de fumar.

No entanto, o que os especialistas dizem é que, na verdade, é trocar um cigarro pelo outro, já que os dois possuem nicotina. "A gente nota que o objetivo, na verdade, não é a fazer a pessoa parar de fumar, mas, sim, trocar um pelo outro, como se a nicotina fosse inofensiva. Só o Reino Unido conseguiu esses dados 'maravilhosos' e o resto do mundo não", diz Liz Almeida, chefe da coordenação de prevenção e vigilância do Inca (Instituto Nacional de Câncer).

O que a maioria das pesquisas mostra é que não há comprovação científica de que os dispositivos eletrônicos sejam uma forma de "tratar" o tabagismo. Uma delas, publicada no periódico Jama, em outubro de 2021, apontou que o uso desses dispositivos eletrônicos não ajudou os fumantes a ficarem longe dos cigarros. De acordo com os autores, essas pessoas aumentaram os riscos de uma recaída ao tabagismo no ano seguinte em comparação com quem parou totalmente de utilizar cigarro eletrônico ou outro produto de tabaco.

"Parar de fumar é a coisa mais importante que um fumante pode fazer para melhorar sua saúde, mas as evidências indicam que a mudança para os cigarros eletrônicos tornou menos provável ficar longe dos cigarros", escreveram os cientistas. Um artigo publicado na revista BJM, no dia 7 de fevereiro deste ano, comprovou o mesmo. Eles analisaram dados de 2017 a 2019 do Population Assessment of Tobacco and Health Study, que acompanha o uso de tabaco entre os americanos ao longo do tempo.

Eles descobriram que quase 60% dos ex-fumantes que eram usuários diários de cigarros eletrônicos voltaram a fumar em 2019. Já um outro levantamento do Inca demonstrou que o cigarro eletrônico é, na verdade, a porta de entrada para o tabagismo.

"O uso de cigarros eletrônicos aumentou em quase três vezes e meia o risco de o indivíduo experimentar o cigarro convencional, e em mais de quatro o risco de passar a utilizar, posteriormente, cigarro convencional", explica a chefe de coordenação do Inca. "Esse aparelho é feito de ligas metálicas e, uma vez em contato com a boca, alguns estudos mostraram que ele libera, sim, substâncias químicas que podem ser cancerígenas. Então, não dá para dizer que ele é inofensivo", afirma Almeida.

Já segundo a pneumologista Maria Enedina, da comissão de tabagismo da SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia), há alguns médicos que permitem a utilização do cigarro eletrônico em situações extremas, quando, por exemplo, o paciente possui uma alta dependência de nicotina. "Mas os estudos mostram que não é uma forma de tratar o tabagismo. Esses dispositivos são artimanhas para conquistar mais pessoas a usar, assim como faziam com o cigarro de papel na antiguidade", afirma Enedina, também professora da Faculdade de Medicina e Ciências Médicas da Paraíba. "A indústria do tabaco é a dona da patente dele atualmente, ou seja, é mais um produto deles."

'Com cigarro eletrônico, meu vício piorou' Um dos pontos de atenção dos especialistas é que, em algumas situações, os usuários dos dispositivos eletrônicos perdem a noção do tempo. Ou seja, elas inalam a fumaça mais vezes ao dia, conforme explica a coordenadora do Inca. "Quando você fuma um cigarro, você vai até o fim e quando acabar, você apaga. Agora, com o eletrônico, você pode ir usando o dia todo até a bateria aguentar. Com isso, as pessoas perderam a noção da quantidade de nicotina que estão inalando", explica Liz Almeida.

Ainda segundo ela, muitos fumantes não se adaptam ao cigarro eletrônico e foi o que ocorreu com o advogado Augusto de Arruda Botelho, colunista do UOL, que fumou cigarro convencional por mais de 20 anos e parou há 4. Em entrevista a VivaBem, ele contou que conseguiu passar 2 anos sem utilizar nicotina, mas com a popularização do cigarro eletrônico, passou a usá-lo de forma recreativa.

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